BI
No meu bilhete de identidade diz assim: ***…, Solteira, **/**/1981, Portuguesa, 1,70m, blá, blá, blá, e depois, lá num cantinho que ninguém vê, está um botãozinho que, ao carregar, dá acesso ao meu dia-a-dia. Ui! Mexer no dito cujo é pior do que acertar numa bomba-relógio, garanto-vos! Porque depois o quotidiano (o meu, claro!) segue numa corrente pior do que as estradas que nos perdem quando voltamos para o Guincho vindos da Serra de Sintra… sinistro…
Acordar. Cedo, tarde? Ninguém sabe. De bom humor, ou de mau humor? Acordar é viver mais um dia, tem que ser de bom humor, mesmo fazendo beicinho e cara de Calimero… Tomar pequeno-almoço, ou não, almoçar – já são horas? Ontem fiquei de pé até às tantas, aposto… Acabou-se a primeira série de "LOST", arranja-se outra coisa qualquer. O melhor é… Espera! E se já não há pão integral? Merda, não acredito que vou ter de ir a correr à padaria por causa do pão. Não tenho tempo nem para pensar que não tenho tempo. Desço as escadas do prédio e a tormenta é o banho que ainda não tomei, os e-mails que ainda não abri, as revistas que ainda não acabei de folhear, os livros que ainda não acabei de ler, a casa por limpar há meses; ligo à minha mãe para saber como está, dou mais três passos e lá está ele (ou eles, porque são muitos, uns vinte, vinte pãezinhos integrais). Chega-me um, consegui o que queria – se toda a gente no mundo stressasse tanto por um pão integral, em vez da guerra contra o terror vivia-se em plena guerra pelo centeio… Enfim, K.'s follies… Relaxar, carregar no rato inexistente para ver o que o dia nos traz de novo, e de outra vez a ansiedade: o duche, a torrada, o portátil, mais uns minutos de caminha, tudo ao mesmo tempo – nada. Ganha a lei do mais fraco. "Kafka à Beira-Mar", e já se vê no que vai dar. Praia?! Quem falou em praia se eu estou há um mês para actualizar o meu curriculum? Mas por que raio querem agora fotos nos CV's? É a foto que vai trabalhar, ou é a pessoa? É que se formos por aí, meus amigos, já eu estava à frente da Galp Energia, de pluma na mão (viva o momento de humildade!)… Não, hoje é de todo impossível sair à rua em menos de quatro horas, estou num bad hair day, num bad face day, num bad eyes day, por isso o MSN fala o que eu não posso dizer pessoalmente, e o telefone faz o resto. Ai, dá para acreditar que sinto falta de trabalhar? Só me sinto livre porque sei que não estou a esforçar-me em vão, meses sem fim, sem um contrato, sem uma garantia, para ganhar tanto quanto uma empregada da Zara? O quê? Sim, já me passou pela cabeça, já. Mas se me conheço como cliente, imagino a falta de paciência que teria como colaboradora… Agora sou um pássaro livre, se bem que os pássaros livres às vezes andam perdidos, não sabem se estão no norte ou no sul, se pousaram em lugar seguro ou se caíram numa armadilha… Vou voando, e lá de cima vou vendo as casas todas, e as pessoas todas, e as coisas todas, e os sentimentos todos, e o mundo todo, e sei tudo, porque só assim afastada consigo perceber como são os pássaros que não estão livres. Tenho energia, será só para algumas coisas? E estes óculos de "ler e estar em casa", de graduação com quatro anos e meio de história, quando arranjarei tempo no meu tempo todo para lhes mudar as lentes? Isso impede-me de ler, e tal questão nem se põe, portanto das duas uma: ou vou a um oculista aberto 24 horas, ou a uma óptica aberta 24/7. Senão, nada feito, e daqui a uns anos é verem-me com uma garrafa entre a cara e os meus fabulosos e originais olhos castanhos escuro-mais-escuro-não-há. Ler, ler, ler. Assimilar. Ouvir música. Pôr-me no carro, ir ter com alguém, e nunca ouvir o telefone porque insisto em repetir o "Mardy Bum" dos Artic Monkeys há uns bons cinco meses… On, and on, and on… Janela aberta, cigarro aceso, o mundo não é meu, nem de ninguém, por isso gosto de estar nele. Jantar em casa? Estas três palavras nunca se conjugaram muito bem, mesmo morando sozinha vai para sete anos… Nem sequer escrevo que não sei estrelar um ovo… Ups, já escrevi! Who cares? Gosto de ficar neste vai-não-vai, faz-não-faz que são os trailers das minhas noites, umas muito iguais, outras fracas que dói, outras boas demais, outras… Decidir. Banho, banho, banho, com o António Variações a cantar, alto e bom som, que "Quando A Cabeça Não Tem Juízo O Corpo É Que Paga". Eu ainda não era nascida e o senhor já escrevia letras a pensar em mim! E depois de haver a resolução, o caminho aparente, há o pijama ou os jeans, o sofá ou a rua, o meu mundo ou o resto do mundo. Quero isto, quero aquilo, quero tudo-tudo e não quero nada. Uns dias a rir e outros com o sorriso mais fechado. Há um SOL que está a nascer e um Outono que se aproxima. Espero que não traga muito frio. Nem chuva. Nem trovoadas (é horrível morar sozinha em noites de trovoada…). Nem guerras. Penso nisto, mas pensar nisto, e escrevê-lo, é exactamente igual a se tivesse sido pensado, e escrito, por um Magnum Sandwich – nós frente ao destino, podemos tanto como eu pude quando me disseram "é difícil contratá-la, as pessoas doentes não interessam para as empresas". A diferença é que um dia essa frase que eu nunca esqueço vai mudar a minha vida. E a de quem ma disse ficará na mesma. Para viver é preciso mais do que respirar, comer, beber água, e estar vivo – é preciso querer viver. Eu quero. Ando a fazer um esforço enorme para o provar isso a mim e a quem gosta de mim como eu sou. Mas hoje, quase dia 11, quero também provar a quem ficou sem tempo de viver, que é sempre possível começar de novo. Há cinco anos fomos todos americanos. Serei sempre americana nesta data – fora muitos os sonhos que ficaram debaixo daquelas torres, foram muitas vidas. Aos mais de três mil que já cá não estão, nunca vos esqueceremos. Eu que escrevo, tu que lês, vocês que comentam, nós que brincamos… somo nós, nós todos, que ainda vamos a tempo…
Acordar. Cedo, tarde? Ninguém sabe. De bom humor, ou de mau humor? Acordar é viver mais um dia, tem que ser de bom humor, mesmo fazendo beicinho e cara de Calimero… Tomar pequeno-almoço, ou não, almoçar – já são horas? Ontem fiquei de pé até às tantas, aposto… Acabou-se a primeira série de "LOST", arranja-se outra coisa qualquer. O melhor é… Espera! E se já não há pão integral? Merda, não acredito que vou ter de ir a correr à padaria por causa do pão. Não tenho tempo nem para pensar que não tenho tempo. Desço as escadas do prédio e a tormenta é o banho que ainda não tomei, os e-mails que ainda não abri, as revistas que ainda não acabei de folhear, os livros que ainda não acabei de ler, a casa por limpar há meses; ligo à minha mãe para saber como está, dou mais três passos e lá está ele (ou eles, porque são muitos, uns vinte, vinte pãezinhos integrais). Chega-me um, consegui o que queria – se toda a gente no mundo stressasse tanto por um pão integral, em vez da guerra contra o terror vivia-se em plena guerra pelo centeio… Enfim, K.'s follies… Relaxar, carregar no rato inexistente para ver o que o dia nos traz de novo, e de outra vez a ansiedade: o duche, a torrada, o portátil, mais uns minutos de caminha, tudo ao mesmo tempo – nada. Ganha a lei do mais fraco. "Kafka à Beira-Mar", e já se vê no que vai dar. Praia?! Quem falou em praia se eu estou há um mês para actualizar o meu curriculum? Mas por que raio querem agora fotos nos CV's? É a foto que vai trabalhar, ou é a pessoa? É que se formos por aí, meus amigos, já eu estava à frente da Galp Energia, de pluma na mão (viva o momento de humildade!)… Não, hoje é de todo impossível sair à rua em menos de quatro horas, estou num bad hair day, num bad face day, num bad eyes day, por isso o MSN fala o que eu não posso dizer pessoalmente, e o telefone faz o resto. Ai, dá para acreditar que sinto falta de trabalhar? Só me sinto livre porque sei que não estou a esforçar-me em vão, meses sem fim, sem um contrato, sem uma garantia, para ganhar tanto quanto uma empregada da Zara? O quê? Sim, já me passou pela cabeça, já. Mas se me conheço como cliente, imagino a falta de paciência que teria como colaboradora… Agora sou um pássaro livre, se bem que os pássaros livres às vezes andam perdidos, não sabem se estão no norte ou no sul, se pousaram em lugar seguro ou se caíram numa armadilha… Vou voando, e lá de cima vou vendo as casas todas, e as pessoas todas, e as coisas todas, e os sentimentos todos, e o mundo todo, e sei tudo, porque só assim afastada consigo perceber como são os pássaros que não estão livres. Tenho energia, será só para algumas coisas? E estes óculos de "ler e estar em casa", de graduação com quatro anos e meio de história, quando arranjarei tempo no meu tempo todo para lhes mudar as lentes? Isso impede-me de ler, e tal questão nem se põe, portanto das duas uma: ou vou a um oculista aberto 24 horas, ou a uma óptica aberta 24/7. Senão, nada feito, e daqui a uns anos é verem-me com uma garrafa entre a cara e os meus fabulosos e originais olhos castanhos escuro-mais-escuro-não-há. Ler, ler, ler. Assimilar. Ouvir música. Pôr-me no carro, ir ter com alguém, e nunca ouvir o telefone porque insisto em repetir o "Mardy Bum" dos Artic Monkeys há uns bons cinco meses… On, and on, and on… Janela aberta, cigarro aceso, o mundo não é meu, nem de ninguém, por isso gosto de estar nele. Jantar em casa? Estas três palavras nunca se conjugaram muito bem, mesmo morando sozinha vai para sete anos… Nem sequer escrevo que não sei estrelar um ovo… Ups, já escrevi! Who cares? Gosto de ficar neste vai-não-vai, faz-não-faz que são os trailers das minhas noites, umas muito iguais, outras fracas que dói, outras boas demais, outras… Decidir. Banho, banho, banho, com o António Variações a cantar, alto e bom som, que "Quando A Cabeça Não Tem Juízo O Corpo É Que Paga". Eu ainda não era nascida e o senhor já escrevia letras a pensar em mim! E depois de haver a resolução, o caminho aparente, há o pijama ou os jeans, o sofá ou a rua, o meu mundo ou o resto do mundo. Quero isto, quero aquilo, quero tudo-tudo e não quero nada. Uns dias a rir e outros com o sorriso mais fechado. Há um SOL que está a nascer e um Outono que se aproxima. Espero que não traga muito frio. Nem chuva. Nem trovoadas (é horrível morar sozinha em noites de trovoada…). Nem guerras. Penso nisto, mas pensar nisto, e escrevê-lo, é exactamente igual a se tivesse sido pensado, e escrito, por um Magnum Sandwich – nós frente ao destino, podemos tanto como eu pude quando me disseram "é difícil contratá-la, as pessoas doentes não interessam para as empresas". A diferença é que um dia essa frase que eu nunca esqueço vai mudar a minha vida. E a de quem ma disse ficará na mesma. Para viver é preciso mais do que respirar, comer, beber água, e estar vivo – é preciso querer viver. Eu quero. Ando a fazer um esforço enorme para o provar isso a mim e a quem gosta de mim como eu sou. Mas hoje, quase dia 11, quero também provar a quem ficou sem tempo de viver, que é sempre possível começar de novo. Há cinco anos fomos todos americanos. Serei sempre americana nesta data – fora muitos os sonhos que ficaram debaixo daquelas torres, foram muitas vidas. Aos mais de três mil que já cá não estão, nunca vos esqueceremos. Eu que escrevo, tu que lês, vocês que comentam, nós que brincamos… somo nós, nós todos, que ainda vamos a tempo…
12 comentários:
"e os meus fabulosos e originais olhos castanhos escuro-mais-escuro-não-há." e a lembrança da frase dita pelos mesmos:
"Contigo foi sempre assim: pude ser feliz até mais tarde".
Welcome back.
R.
...ah, adorei o momento de humildade!
Kiss for the Miss
...queria dizer algum coisa mas... fiquei sem palavras...obrigada pela partilha!
Miss K -
Just a small thank you from this side of the Atlantic for remembering this day. It is a tough one for sure. Thanks also for the constant flow of thought provoking, interesting, entertaining and quality content that you keep posting!
Sean (amigo da katia dhanis)
Ah... que bom ter-te de volta, da forma autêntica com que ensinaste os teus leitores a apreciar-te...
Obrigado.
Bem vinda... ;)
"É difícil contratá-la, as pessoas doentes não interessam para as empresas." Fiquei absolutamente chocada quando li isto. Foram mesmo capazes de dizer isto? É de uma crueldade insuportável...
S.:
...
Miss K.
Bom adorei, mas confesso que o meu coração começou a bater como se estivesse a fazer a meia maratona…..a mil à hora, do teu B.I até ao fatídico 11 de Setembro;)
Parabéns energia não te falta, característica boa para trabalhares em grupo e numa grande empresa, põem a dita foto no Cv’s e o lugar é teu:)
Bjs Ruca
Para os caminhos sinistros em Sintra um mapa 1/25000 deve ajudar ... http://www.igeoe.pt/igeoesig/igeoesig.asp
A do ovo não é muito difícil: http://www.ehow.com/how_2637.html
Para o Norte e o Sul chega por vezes uma bússola, o Sol, as estrelas ou a Lua. Porém, mesmo confiando na direcção tomada, às vezes o problema é não saber se se conseguirá voar sem pousar até chegar onde se quer.
Tal como o post terminado 2 minutos antes do limite, temos de nos despachar para não sermos ultrapassados pelo tempo (timing).
:)
Não era uma entrevistadora. Foi o meu antigo chefe.
o meu bi não tem esse botãozinho........
a) Miss K: condenadíssima a pagar qualquer coisa ao je por chamar sinistr@ a qualquer coisa que seja (mesmo as estradas) relacionada com Sintra. Segundo o meu Código Penal isso é crime punível com pagamento de copo ao ofendido. E a decisão não é passível de recurso. Temos pena...
b) Curioso momento humildade/menina do gás. És sempre assim? E já agora mostro eu a minha veia portuga: Arranjam-se aí umas borlas?? :)
c) Artic Monkeys? Ora aí está algo que é sempre agradável de ouvir. Adoro o som daquela guitarra "suja", tão tipica da indie-brit-pop-etc-e-tal music...
d) "A diferença é que um dia essa frase que eu nunca esqueço vai mudar a minha vida. E a de quem ma disse ficará na mesma." --> Temos filósofa! Grande frase Miss K. E só prova que conseguirás com toda acerteza superar um mau momento por que passaste. Mas todos já lá passámos por lá, e melhor ou pior, lá nos vamos safando, afinal de contas: SOMOS TUGAS!
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