Manifesto anti-Gallo
Tirem-me para sempre a luz de Lisboa, tirem-me as encostas do Douro, o Tejo e o Alentejo, tirem-me a calçada dos passeios e os azulejos de parede.
Tirem-me o ouvido.
Tirem-me para sempre o choro da guitarra e o pranto do fadista, tirem-me os pregões das mulheres do bulhão e a pronúncia de norte a sul, tirem-me afúria de espuma das ondas e o grito do golo.
Tirem-me o tacto.
Tirem-me para sempre o sol de Inverno a bater na cara, tirem-me o barro a ganhar forma entre os dedos, tirem-me o rosto queimado da minha mãe e a mão áspera do meu pai.
Tirem-me tudo isto, mas não me tirem o gosto.
Porque se eu ainda for capaz de saborear a alheira a rebentar de sabor, ou o bacalhau com todos a nadar em azeite, serei capaz de dizer, se não me tirarem a fala, que estou em Portugal.
Azeite Gallo. A cantar desde 1919."
Ainda bem que não te tiraram a fala, ainda és capaz de dizer que estás em Portugal... E depois, de que te servirá? Não tens olhos para ver a luz de Lisboa, as encostas do Douro, o Tejo e o Alentejo, menos ainda a calçada dos passeios e os azulejos de parede.
Não ouves o Gallo a cantar mas sabes, pelo azeite, que estás em Portugal, e podes gritá-lo, já que ninguém te levou a fala... E gritas. Para quê, porquê, se deixaste de querer ouvir o choro da guitarra e o pranto do fadista, os pregões das mulheres do bulhão e a pronúncia de norte a sul, a fúria de espuma das ondas e o grito de golo?
Consegues, através do gosto, afirmar que estás em Portugal, porque não te roubaram a voz. Mas para que queres estar em Portugal, se não podes sentir o sol de Inverno a bater na cara, o barro a ganhar forma entre os dedos, e rejeitas tocar o rosto queimado da tua mãe e a mão áspera do teu pai?
Sem a vista, o ouvido e o tacto, de que te serve saber, "pela alheira a rebentar", que estás em Portugal? Quem não quer ver, ouvir nem sentir, não é português. Porque é a vista, o ouvido e o tacto que nos trazem o paladar. Se o azeite canta desde 1919, Portugal sente desde sempre.
Azeite Gallo. A cantar desde 1919."
Ainda bem que não te tiraram a fala, ainda és capaz de dizer que estás em Portugal... E depois, de que te servirá? Não tens olhos para ver a luz de Lisboa, as encostas do Douro, o Tejo e o Alentejo, menos ainda a calçada dos passeios e os azulejos de parede.
Não ouves o Gallo a cantar mas sabes, pelo azeite, que estás em Portugal, e podes gritá-lo, já que ninguém te levou a fala... E gritas. Para quê, porquê, se deixaste de querer ouvir o choro da guitarra e o pranto do fadista, os pregões das mulheres do bulhão e a pronúncia de norte a sul, a fúria de espuma das ondas e o grito de golo?
Consegues, através do gosto, afirmar que estás em Portugal, porque não te roubaram a voz. Mas para que queres estar em Portugal, se não podes sentir o sol de Inverno a bater na cara, o barro a ganhar forma entre os dedos, e rejeitas tocar o rosto queimado da tua mãe e a mão áspera do teu pai?
Sem a vista, o ouvido e o tacto, de que te serve saber, "pela alheira a rebentar", que estás em Portugal? Quem não quer ver, ouvir nem sentir, não é português. Porque é a vista, o ouvido e o tacto que nos trazem o paladar. Se o azeite canta desde 1919, Portugal sente desde sempre.
9 comentários:
Há muito tempo que me habituei a ver nos reclames do azeite Gallo, anúncios bem conseguidos e bonitos, tanto a nível estético como de conteúdo. Anúncios calmos, que pintam um Portugal por vezes mais rural mas sempre prazeroso de ver e ouvir. Deste reclame, devo dizer que gostei particularmente pelo texto.
Num país onde a justiça de cega tem muito pouco e normalmente só toma medidas contra os criminosos de poucos recursos financeiros, num país onde a classe política toma decisões catastróficas e muitas vezes em beneficio próprio sem que nenhuma conta lhes seja pedida, num país onde o mercado alimentar é inundado por produtos espanhóis (muitas vezes muito piores que os nossos) a preço da chuva por falta de medidas que defendam as nossas produções, num país onde a saúde e a segurança social funcionam inacreditavelmente mal, num país onde os recursos naturais são estragados ou desperdiçados em nome dos interesses do lobby da construção civil, num país que idolatra uma pessoa como Scolari, que supostamente vem de um país irmão mas que ofende os Portugueses, que age como se de um Deus se tratasse e clama em praça pública pelo linchamento de todos os intelectuais (se fossem só esses!) que o criticam e às suas opções, uma pessoa que faz gato e sapato de tudo e todos chegando mesmo ao ponto de se oferecer a outros países sem que por isso lhe suceda rigorosamente nada, num país assim parece-me mais do que descabido, quase insultuoso falar mal do azeite.
Bem sei, pelo que tenho lido, que anda com muito tempo livre e pouco com que o ocupar, mas antes de se atirar com unhas e dentes ao que temos de bom, se calhar era mais lógico atirar-se ao que temos de mau.
Yours trully, R.
Caro R.:
Pois é, parece que as pessoas "com muito tempo livre" e que têm "pouco com que se ocupar" começam a ficar maluquinhas e a escrever disparates a torto e a direito. Ainda bem que há os trabalhadores, sãos e ocupados, para os chamar à razão.
Desta vez tenho apenas uns minutinhos para lhe "dizer" o seguinte:
a) É de muito mau gosto da sua parte criticar um texto de alguém baseando-se na sua ocupação (ou falta dela). "Pelo que tem lido (...)", não lhe dá o direito de me considerar um ser humano com menos capacidades pensantes e menos espírito crítico;
b) Vá buscar o terço:
- já falei com outras pessoas da minha faixa etária (24 anos para cima) que ficaram igualmente chocadas com o script do anúncio;
- gosto particularmente do Sr. Scolari e, se a vida mo permitir, ainda hei-de escrever um post sobre ele;
c) Não lhe vou pedir para voltar a ler o guião em causa, para que perceba o que ali me choca. Tenho uma ideia melhor - antes de se atirar com unhas e dentes a quem faz (e partilha) aquilo que gosta, se calhar era mais lógico deixar de visitar este estaminé.
Cara K.:
A) Quem costuma, por norma, estar muito ocupado, quando deixa de estar tende a ficar susceptível a irritar-se ou a implicar com toda e qualquer coisa. É algo natural e que sucede a qualquer pessoa.
Não a estava a chamar à razão, estava apenas a explanar um ponto de vista, tal como você fez no post.
B) Sou da exactamente da sua faixa etária e não fiquei nada chocado pelo anúncio. Está muito bem conseguido e faz todo o sentido, na óptica de que é um anúncio a um produto alimentar e é precisamente isso que "vende". Não gosto do Sr. Scolari, nunca tive nenhum fascínio por pessoas de "arrogância oca" e com tiques ditatoriais, recordam-me aquele "senhor" austríaco que também gostava muito pouco de críticas.
C) Eu percebi claramente o que a choca através da leitura do seu texto. Não estou a dizer que não tem o direito a ficar chocada (porque tem, esse e muitos outros). Cada pessoa sente o que a rodeia à sua maneira e certas susceptibilidades ferem-se mais facilmente que outras. E não pense que me atirei a si com "unhas e dentes", if I had done that, believe me you would know.
Yours (still) trully, R.
PS: Bem sei que por vezes o meu tom "sarcástico" pode ser mal interpretado, mas acredite quando lhe digo que a intenção não era de maneira nenhuma "atacar".
Acredito no que me diz. Mas sim, o seu comentário acabou por me chamar à razão.
Expus-me demasiado neste meu espaço, e talvez tenha sido isso que o levou a pensar que poderia dirigir-se a mim como se fosse uma parasita social no verdadeiro sentido do termo.
Vai ser difícil, mas tentarei fazer com que o "Life" tenha pouco, cada vez menos, da minha vida. Só assim se poderão criticar apenas os textos, e não o seu autor (menos ainda a sua vida, seja ela um corropio de realização pessoal ou uma rotina de tempo livre desinteressante).
Atenciosamente,
Miss K.
Evidentemente que te sujeitas a este tipo de comentários tristes, ao expores a tua vida da forma desabrida como o fazes aqui... É um risco, com benefícios/prejuízos por ti certamente ponderados, e dos quais deves ter sempre exacta e total noção.
De todas as formas, é pena que outros que gostam de te ler como te escreves, saiam prejudicados pelo juízo crítico de alguns... Se os blogs forem desprovidos de vida, e essencialmente de alma, ninguém os lê. Porque é que achas que és certamente tão apreciada pelos teus leitores?...
Bem ... desde 1143 (ou talvez 1093 (http://pt.wikipedia.org/wiki/Henrique_de_Borgonha%2C_Conde_de_Portugal).
Quantos aromas, paladares, sons, texturas e visões nao terão já sido sentidos neste Portugal!?
Grande país!
:)
Cara miss K, tudo o que se publica é sujeito a crítica (construtiva, claro está - para ter direito de resposta...), já sujeita a opiniões do tipo : "Bem sei, pelo que tenho lido, que anda com muito tempo livre e pouco com que o ocupar, mas antes de se atirar com unhas e dentes ao que temos de bom, se calhar era mais lógico atirar-se ao que temos de mau", não me parece que mereça sequer resposta. Mais, a resposta que deu ainda a expõe mais intimamente do que qualquer anterior post.
Melhoras profissionais e bloguistas.
Cordialmente.
Manifesto Anti Silêncio...
Keep the blog moving! (I'll be gone for quite a while)
Kissez
É pá, com tanta confusão só tenho a dizer:
- Continua as always Miss K! É assim que gostamos do blog (e consequentemente de ti)
- As críticas só nos fazem crescer. (Não que sejas pequenina, mas creio ter-me feito entender.)
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