quarta-feira, março 29, 2006

Saudades do Futuro

Quase três da manhã e eu à espera do Pai Natal... ou do Coelhinho da Páscoa, porque no fim destas revigorantes doze (sim, leram bem, 12) barras de chocolate, devo estar ansiosa por uns ovinhos. Carências afectivas ou TPM? Bah! Que sejam as duas coisas, as mulheres SP (signa a explicar num futuro próximo), não têm receio de assumir as suas fraquezas. Exemplos? Agora batias-me à porta, porque estou cheia de saudades tuas, e matávamos o tempo perdido em momentos infinitos... Benne? Deve ser por isso que o génio que a seguir reproduzo, de seu nome Eugénio de Andrade (leiam que o homem sabia a vida toda antes de ela o saber a ele), tinha saudades do passado e eu, pelo contrário, tenho saudades do futuro: Ele tem as recordações, eu não, porque não cheguei a viver para recordar.



Adeus

Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
já não se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certezade
que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.

Eugénio de Andrade

5 comentários:

Anónimo disse...

12!!! também gostava de comer 12 chocolates sem ficar com uma barriga de buda!!! merda de genes que eu tenho!!!

Francisco Nogueira disse...

E não se poderá chamar a tais "saudades do futuro" sonhos? Percebo perfeitamente o que queres dizer, porque sem dúvida também dou por mim a ter essas mesmas "saudades". Será que diferem muito dos sonhos? Temos normalmente como costume pensar que os sonhos são coisas algo utópicas. E talvez estas "saudades do futuro" nos pareçam mais reais ou verosímeis.
Mas será que o são mais do que os sonhos..?

Francisco Nogueira disse...

Afinal, "Life is a Masterpiece" , portanto vamos esperar que sejam bastante verosímeis, e de preferência num futuro próximo. E se não for pedir de mais, que depois não as voltemos a ter no passado.

Anónimo disse...

Não queria dizer isto, mas existe um latente sofrimento nas tuas palavras. Pára para respirar, please!

Anónimo disse...

OI Miss, boa noite! Eu li muito sobre Eugênio de Andrade na Faculdade de Letras (UNIFRAN- FRANCA SP) e lá conheci profundamente os escritos de muitos gênios portugueses, dentre eles Eugênio de Andrade, sem falar FP, Miguel Torga, vergílio ferreira, saramago, branquinho da fonseca (amo o conto O Barão). Saudade do futuro é algo sensacional, mas impróprio, pois o futuro não nos foi desvendado, ou seremos como o Edipo Rei ou seremos visionários, puros visionários do V Império (Port.) Bye, Antonio, Brasil